segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Homenagem a Simone Sartori

Eu jurei pra mim mesma que não iria escrever aqui no blog sobre o São Paulo Fashion Week. Nada pessoal, apenas o que dizer a respeito do evento de moda mais comentado, mais escarafunchado desse país?

Entretanto essa foto da jornalista Simone Sartori me fez ter que voltar atrás e quebrar minha promessa.


Simone é jornalista de formação, de uma época em que se estudava jornalismo. Talvez esses garotos que hoje em dia se formam, informam e se deformam pela internet não saibam, mas houve uma época em que para se obter o Registro de Jornalista era preciso ter cursado Jornalismo. Se por um lado a desobrigatoriedade do diploma democratiza um ato tão natural como o de escrever, por outro banalizou a profissão. Eu mesma conheço vários profissionais que se sentiram tão desvalorizados que acabaram por mudar totalmente de área e começaram uma nova carreira.

Simone não desistiu, mas sua paixão pela fotografia aos poucos está direcionando-a por novos caminhos dentro do jornalismo. Ela tem um olhar sofisticado, sensibilidade de artista de verdade, que por vezes a coloca no lugar certo, na hora certa. E quem já a viu trabalhar não entende de onde aparecem esses momentos. Ela é pequena, tímida, discreta. Está sempre com a câmera “armada”, bala na agulha.

Seus tiros mais certeiros não são as fotos que todos esperam, mesmo quando fotografa celebridades. Não que tenha nascido pra paparazzi pois ela não se deslumbra com artistas, mas quando todos estão com as câmeras apontadas para a Gisele Bündchen, Christina Aguilera, Demi Moore, ela capta os fotógrafos se espremendo no pit.

Foi então que me deparei com essa foto. Que daria pra fazer um tratado de antropologia, caso eu fosse antropóloga. Se fosse poeta, talvez escrevesse uma música.

Alheia a toda correria dos camarins, a modelo de olhar perdido, cansado, permanece imóvel, paralizada. A maquiagem pálida contrasta com a paleta de sombras do maquiador. Ela então parece morta, empalhada. Ao seu redor tudo tem vida, tudo tem cor, tudo se mexe. Mas ela é apenas um cabide. O único sinal de vida é o canto do lábio mordido (de fome? de dor?). Faz lembrar aquela música do Zeca Baleiro: “Eu tava triste, tristinho! Mais sem graça que a top-model magrela na passarela…”

Ela aguarda sem reclamar o puxa-estica das escovas, o calor das chapinhas que queimam o couro cabeludo. E como boa profissional “engole o choro”, não reclama. A ditadura da moda impõe que seja magra acima do aceitável, mas ainda assim ela desfila, maquiada como morta, com seu passo de gazela. Não sorri, não reclama e ainda é modelo. Um modelo a ser copiado por milhares de meninas que sonham em vestir aquelas roupas, que sonham em ter aquele corpo, que algumas apenas conquistam por anorexia. E o público em geral não está ali pra ver as roupas, mas pra ver e ser visto. E a essência do evento se perde.

Talvez por isso faltaram tantas grifes importantes nessa edição. Talvez por isso eu não tenha vontade de falar sobre o São Paulo Fashion Week. O que deveria ser o maior evento de negócios da moda brasileira virou desfile de celebridades em que os formadores de opinião são ex-BBBs, ex-panicats e ex-famososquem?

Eu faço roupa para mulheres reais, minhas modelos são coradas e sorriem. Aos poucos vou entendendo que a minha missão como estilista é realizar os sonhos das mulheres de verdade, que assim como eu não sabem quem é o “famoso” ex-BBB, que nunca ouviu falar em panicats e que desfila com muita segurança pela passarela da própria vida com um sorriso que brota dentro do seu coração.

Essa foto é a antítese de tudo que quero para o meu trabalho. Mas a meu ver deveria ganhar prêmio. Parabéns, Simone, por olhar o mundo com esse olhar de jornalista crítico. Longa vida a sua carreira de fotógrafa!

2 comentários:

  1. poxa vida, como me enxergas bem !
    bem melhor e mais agradável do que eu mesma :D
    obrigada, fiquei emocionada :.)

    e um viva a todas as pessoas que, como
    nós, enxergam o outro lado das coisas
    (geralmente o mais interessante) !

    :D

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  2. Texto e foto deviam dar as mãos e sair brilhando por aí!
    E que a moda seja sempre mais que uma modelo descolorada num mundo cheio de cores, nos fazendo sentir mal por sermos coloridos.
    Parabéns pras duas!

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